A Grande Esperança e a Ruína Social


Leio na Imprensa local que o “Projeto A Grande Esperança” irá distribuir 170 milhões de livros em todo o mundo (42 milhões no Brasil e 800 mil em Mato Grosso do Sul). Diz o comunicado da Igreja Adventista do Sétimo Dia, responsável pela iniciativa, que a distribuição da obra escrita pela norte-americana Ellen Gold White, vem para fazer frente à situação que o mundo atualmente se encontra, onde tudo parece “caminhar para ruína social, moral, econômica”, oferecendo alento e dizendo que “com certeza tudo terminará bem se nos mantivermos firmes ao lado do nosso Salvador Jesus” (1).

É interessante notar como a humanidade nos momentos de crise sempre recorre a Deus em suas diversas denominações para depositar n’Ele suas esperanças. Desde os primórdios até os dias atuais, desde as confissões mais céticas até as mais fervorosas, o catecismo é o mesmo. É interessante notar também que a maioria das religiões não coloca no centro de suas preocupações e debates, de maneira crítica e holística, o contexto de desajuste que os homens vêm construindo e praticando no decorrer da história, contra si e o meio-ambiente, e que, nos momentos atuais, assume proporções assustadoras.

O que vemos na verdade é que cada vez mais há o distanciamento entre os ensinamentos divinos e a realidade. Não mais mensura-se a fidelidade ou infidelidade humana ao projeto de salvação oferecido por Deus através de seu filho Jesus Cristo, na nossa cultura, a partir das ações praticadas. Achamos que tudo acontece num plano superior, predefinido, fora do alcance do homem e onde não há como sua pequenez penetrar. E nem faz por onde. Esse pensamento popularizou-se, cumpre lembrar, após a Reforma protestante, que influenciou as ideias de tantos pensadores contemporâneos, como é o caso da profetisa e precursora do movimento Adventista sabatista, Ellen Gould White (1827-1915).

No curso de uma linha etéria e nefelibática, essa corrente de pensamento adentra com sabedoria o campo da metafísica e da alma humana: “discutem algumas das questões que mais interessam a todos nós, como: razão do sofrimento, a verdadeira paz, a vida após a morte e a vitória final do amor de Deus”. Em que pese este seja o tema mais abordado pelos animadores da fé nos templos de tijolos ou virtuais que tomam de assalto nossa sala, sobretudo aos finais de semanas ou nas madrugadas, observa-se uma dicotomia gritantemente avassaladora.
Verifica-se um sistemático distanciamento entre os apelos do Espírito e as necessidades da Carne, tal qual nos fala a Epístola de Paulo aos Gálatas 5,13-26. Os desvios que a humanidade vem praticando e que tem resultado em desesperança e descrédito, pouco se fala ou se faz para transformar essa realidade – social, política e económica — de pecado e desajuste com os ditames da fé bíblica. O livro de Ellen White, restauracionista que é, busca fazer a sua parte: oferece aos cristãos pela via suave, um caminho, uma direção. Tudo no esforço de “mostrar a mão de Deus guiando os cristãos ao longo da história” (2). Algo como se houvesse um “conflito cósmico sendo travado na terra entre o bem (Deus) e o mal (Satanás)”, embate que acontece independentemente dos homens.

Isso, entretanto, soa tão distante e irreal que nos põe em dúvida se esse é o caminho mais acertado, homens de ciência que somos. Mas, para Ellen Gould Harmon, que é o nome verdadeiro da “irmã White”, não havia dúvida nas suas convicções de fé. Descrita como “uma das figuras mais vibrantes e fascinantes da história da religião americana” (3), tornou-se a autora feminina mais traduzida de não-ficção na história da literatura, bem como o mais traduzido autor de não-ficção americana de ambos os sexos. Escreveu mais de 5 mil artigos e 40 livros. Outros estudos seus tratam de teologia, evangelização, vida cristã, educação e saúde, tendo sido uma defensora do vegetarianismo. Promoveu também a criação de escolas e centros médicos.
O portal Vikipédia traz uma longa biografia da escritora dando destaque para as experiências visionárias, que começaram aos 17 anos e se prolongou durante o resto de sua vida em diversas ocasiões, sendo-lhe “revelado”, no seu entendimento, o poder de Deus. Sua vontade era que o mundo fosse “contagiado” pela mensagem do segundo advento de Cristo à Terra para buscar aqueles que servem ao único Deus. Isto precisa ser proclamado em cada igreja em nossa terra” –dizia. “Os cristãos precisam saber disso, e não colocar os homens onde Deus deveria estar, para que eles não sejam mais adoradores de ídolos, mas sim do Deus vivo. Existe idolatria nas nossas igrejas” denunciava.

Fátima e Mediugórie, no universo católico são exemplos de cristãos que tiveram visões e presenciaram aparições divinas semelhantes, revelando ao mundo um último apelo de conversão à Deus. Numa região convertida ao catolicismo e duramente perseguida pelo domínio turco entre 1478 e 1878, a mãe de Jesus em sua aparição a seis jovens croatas, revelou-lhes uma dezena de segredos sobre acontecimentos que sobrevirão, em breve, à humanidade. Após a realização do 10º segredo, segundo as videntes, “o poder de Satanás será destruído e um Novo Pentecostes marcará o início de um Novo Tempo” (4). O apelo à conversão interior, percebe-se, está muito presente quando os homens encontram-se em dificuldades extremas.

Ainda que as religiões pouco possam contribuir para mudar os contextos sociais, políticos e económicos da sociedade atual, sobre os alertas e verdades advindas da Sabedoria superior, vindas do Pai Celestial e destinadas a seus filhos amados, elas são mais do que necessárias, porque moldam o interior do homem. São sinais de esperança e estímulo para aqueles — revolucionários, como Francisco, Padre Pio, Tereza de Calcutá, Camilo Torres, entre outros –, que lutaram por transformações nas estruturas do seu tempo. Lutaram para que os homens do nosso tempo interfiram em defesa dos mais fracos em face do opressor. Serve também de alento à hierarquia das igrejas, missionários, pastores, padres, rabinos, bispos e diáconos, para que arrisquem mais suas vidas na proclamação dos valores do Evangelho da Justiça e da Solidariedade, prenúncio da vida Eterna, e ajudem a orientar o homem, em concretum, no curso de seus dias, até que Ele venha.
*Carlos Alberto dos Santos Dutra
http://dutracarlito.com/artigos.html
fonte
ps: Publicado na íntegra
José Carlos Costa