Pastor adventista fala do que vê na crise da Ucrânia

Pr. Jonatan Conceição está no país do leste europeu com sua esposa desde 2009Kiev, Ucrânia … [ASN] O pastor adventista brasileiro Jonatan Conceição, que mora desde novembro de 2009 em Kiev, capital da Ucrânia, tornou-se testemunha, junto com a esposa Priscila, de uma verdadeira guerra civil que abala o país há vários dias. Os protestos começaram quando o presidente ucraniano deposto Viktor Yanukovych rejeitou, em novembro do ano passado, um acordo com a União Europeia, preferindo uma aproximação comercial com a Rússia. Milhares de pessoas – favoráveis à integração com a Europa – deram início a manifestações pacíficas e à ocupação da Praça da Independência. Há confrontos graves entre manifestantes e forças policiais que já deixaram dezenas de mortos e centenas de feridos. Jonatan Conceição, que trabalhou por dezenas de anos na TV Novo Tempo no Brasil, agora é diretor de produção de TV da chamada Divisão Euro Asiática da Igreja Adventista do Sétimo Dia, que coordena as atividades adventistas em 13 países do leste europeu e possui 140 mil membros. Somente na Ucrânia, há pelo menos 60 mil adventistas. A reportagem da Agência Adventista Sul-Americana de Notícias (ASN) conversou, por e-mail, com Jonatan sobre os últimos episódios no país.


ASN – Na sua avaliação, como morador em Kiev, é possível acreditar em saída pacífica para esse impasse na Ucrânia com a Rússia?

Pr. Jonatan Conceição - Eu acredito que sim, mas sei que existe a possibilidade de haver uma divisão no país, pois existe um movimento separatista dentro da Ucrânia. Kiev, a capital, é mais pró-europeia e por isso o movimento foi forte aqui, mas não é o que ocorre na Crimeia ou em cidades mais ao sul ou leste, próximo à Rússia. Tanto é que foi para Donetsky que o presidente Yanukovish fugiu (ou se refugiou). À leste, encontramos cidadãos mais próximos da Rússia e ao ocidente os pró-europeus. Uma homenagem aos manifestantes que perderam a vida em Kiev bastou para incendiar os ânimos nas ruas em Donestk, no leste do país onde as orações foram interrompidas por ucranianos pró-russos. “Fascistas” e “vão-se embora” foram algumas das palavras mais ouvidas. A tensão é, também, evidente na Crimeia que já pediu a independência à Ucrânia. Neste domingo um grupo de pessoas se deslocou à câmara municipal de Kerch e substituiu a bandeira nacional pela da Rússia. E eu pude ver na TV quando um ucraniano veio com a bandeira do país, ela foi tomada da mão dele e queimada. A marcha foi acompanhada por dezenas de pessoas que se sentem mais próximas de Moscow (capital da Rússia) que de Kiev. Falam russo, pertencem à Igreja Ortodoxa Russa e eram até há bem pouco tempo dirigidos por um homem fiel ao Kremlin. E em alguns lugares se fala em formar um movimento separatista e, se possível, lutar para isso.

ASN – Quais os impactos para as igrejas desse impasse, inclusive a Igreja Adventista da qual você faz parte?

JC - Desde que começou a revolução em novembro, nada havia mudado, com exceção da última semana, quando houve uma verdadeira batalha no centro da cidade e os acessos à cidade foram fechados e o metrô, vital para a cidade, também parou de funcionar. Mas como a Igreja Ortodoxa se posicionou ao lado do movimento pró-europa, o presidente da União Ucraniana da Igreja Adventista decidiu emitir uma nota onde mostrava qual seria a posição da igreja:

Igreja Adventista do Sétimo Dia

CARTA em conexão com os acontecimentos políticos na Ucrânia

Queridos irmãos e irmãs! Graça e paz da parte de nosso Senhor Jesus Cristo nestes difíceis confrontos de momento estressante na Ucrânia! Ao longo dos últimos dois meses, o que estamos testemunhando é, de certa forma, o que fazem os participantes dos eventos que acontecem no centro de Kiev e de outras regiões do país. Testemunhas, porque todos os dias ansiosamente observam o andamento desses processos. Esperamos que o Senhor levante orações pela paz e prosperidade para a Ucrânia, a sabedoria e prudência para as partes em conflito. Recentes desenvolvimentos em Kiev indicam que precisamos unir esforços em oração a Deus para a Ucrânia.

Nos dias de hoje , e especialmente noites quando as paixões guerreiras das partes atingem o seu ponto de ebulição , levando com eles uma ameaça para a vida humana , nós encorajamos todos os crentes em oração de intercessão especial ao Senhor , suplicando -Lhe a misericórdia para o povo da Ucrânia e da resolução pacífica do conflito , um corações humildes daqueles em cujas mãos o poder e sabedoria para aqueles que são responsáveis pelo destino dos seus concidadãos , o comportamento decente de quem está indo para ações livres , de bom senso e senso de responsabilidade por suas declarações e ações de todos os lados do confronto comum . Pedimos que você não se envolva em atividades que podem provocar ou incitar o ódio entre as pessoas. Seja tolerante com o outro e para aqueles ao seu redor, independentemente de suas opiniões ideológicas, políticas ou religiosas. Não deixe comentários abusivos em fóruns e redes sociais. Em vez disso, as chamadas para a resolução de conflitos por meios pacíficos.

Afinal de contas, a violência não tem sido uma base razoável para a construção de um novo e brilhante futuro na vida pessoal e pública. Você tem o direito de expressar sua cidadania, implementá-lo no contexto dos mandamentos de Deus para amar a Deus e ao próximo. Não se deixe ser atraído para ações questionáveis e as medidas que poderiam manchar a sua reputação como um cristão e um membro consciente da sociedade e manchar o bom nome da Igreja a que pertence. Seja sempre prudente , especialmente nestes dias difíceis para o nosso país . Desejamos que Deus enviou paz sofredor povo ucraniano. ” Que Deus abençoe você e que Ele te guarde ; Que o Senhor possa brilhar sobre ti ti, e tenha misericórdia de ti ; O Senhor levante o seu rosto sobre ti, e te dê a paz ” (Números 6:24-26).

Victor Alyeksyeyenko , Diretor da Igreja Adventista na Ucrânia

Pelo que sei ele também deixou claro que a igreja não se posicionaria por um lado, mas estaria orando pela paz e para Deus desse sabedoria para que fosse encontrada uma solução pacífica. Sábado passado foi um sábado onde foi feito oração pelos familiares que perderam os seus queridos nessa revolução.

ASN – O que você testemunhou aí em relação aos sentimentos da população em geral, não a que está nas ruas, mas a que eventualmente assiste? Quais são esses sentimentos?

JC - Como eu disse, moro em Kiev, onde a maioria é pró-Europa, mas esse não é o sentimento de todo o país. Esse é um país dividido em língua e opinião política e isso pode causar divisões e violência.

ASN – Tem contato com manifestantes? Se tem, o que conseguiu deduzir do discurso deles quanto ao futuro do país?

JC - Conheço pessoas que foram até a praça. Na verdade, eu mesmo estive a poucas quadras de lá onde eu já podia ver as barricadas, mas isso em tempo em que a batalha não estava tão intensa. Conheço um adventista que sábado estava na igreja e ele deu uma entrevista a um jornal contando que estava trabalhando ativamente entre as pessoas na praça da Independencia. Uma senhora na praça dizia a uma emissora de TV: Não creio que devemos sair da praça, pois a besta está ferida, mas ainda está solta, e não sabemos o que ela ainda pode fazer. Na verdade, a praça continua com as barricadas e cheia de gente. O local é patrulhado pelas milícias, tendo em vista que a força policial foi recolhida e aguarda novas instruções do novo governo interino. Existe ainda insegurança, pois se não há polícia nas ruas, pode haver algum tipo de violência, embora, na região em que vivo, não sinta nenhum tipo de tensão. Mas é bom não arriscar. Para a Igreja Adventista, uma união com a Rússia pode afetar a liberdade religiosa que gozamos nesse país. Aliás, esse é o país com maior liberdade religiosa na Divisão Euro Asiática. [Equipe ASN, Felipe Lemos]

Entenda mais sobre o contexto dessa guerra civil e acesse